O mundo de Mateus é um
universo colorido, recheado de cores vibrantes, de muita energia e uma “chuvinha”
de sensibilidade. É fácil entender que ele é um menino muito especial. Mateus
tem três anos de idade. Ele vive com a mãe na cidade de Campina Grande, na
Paraíba. E é ela, Maria Eduarda, que nos relata sobre como a arte mudou a vida
da família.
Os pais receberam o
diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista aos 2 anos e 7 meses de vida.
Neste momento começava a busca por profissionais e tratamentos para que o filho
pudesse evoluir dentro das especificidades características do autismo. Foi por
meio da Terapia Ocupacional que Duda começou a pintar com o filho. “A terapeuta
ocupacional nos motivou a iniciar atividades com tinta de dedo no papel, pois
ele não gostava de se sujar e deveríamos criar uma maneira de mudar esse
cenário. Eu tentei algumas vezes e percebia que não fluía muito. Um dia, peguei
um quadro velho, algumas tintas e pincel e o deixei interagir para perceber se
ele iria se interessar mais. Eu fiquei observando de longe e identifiquei uma
relação diferente dele com a tela e logo percebi que ali havia uma
potencialidade. Comecei a incorporar essa atividade como uma terapia, um
momento meu e dele”, relata.
Começava a se desenhar
uma nova realidade na vida de Mateus. Antes disso, a mãe precisou superar
alguns desafios, como o afastamento do trabalho para dar atenção às
necessidades do garoto e a mudança de cidade para integrá-lo à família e estimular
a interação social. Mas era mesmo por meio da tela que Mateus tentava se
conectar com o mundo, com as pessoas e com ele próprio. “Ele ainda não possuía
comunicação verbal, apenas ecolalia. Com o tempo percebi que ele tentava falar
o nome das cores e fiquei muito emocionada. Ali iniciou a comunicação verbal
dele. Ele foi perdendo a rejeição à sujeira, compreendendo melhor o espaço,
melhorando a coordenação motora”, relembra a mãe.
A terapia deu lugar na
verdade a um grande prazer na vida de Mateus e da família e a uma espécie de
tratamento alternativo que o fez evoluir significativamente, sobretudo na fala.
“A pintura trouxe a comunicação verbal dele. Não que todos os tratamentos não
sejam importantes e complementares. Claro que ele não estaria falando tão bem
sem uma fonoaudióloga. Não estou tirando esse mérito. Ela é maravilhosa! Mas,
normalmente, as crianças autistas precisam de algo que as motivem, que seja um
elo entre elas e o mundo. Eu atribuo o elo do Mateus à pintura. Ele fica muito
feliz quando pinta”, explica.
Como todo menino,
Mateus pinta o sete, é bastante ativo, mas é mesmo nas tintas que ele derrama
sua energia. “Ele pede para eu comprar telas, diz que quer a tela grande. Ele
vai comigo e escolhe as tintas na loja. Acho que todo esse processo o aproxima
das pessoas, ajuda na socialização, na introdução dele a novos ambientes. Ele
sabe exatamente o que quer pintar e fica com raiva se sugerimos algo”, diz.
Pouco a pouco os
quadros vão tomando forma, formando um ser artista e informando a todos sobre
muitas lições do autismo que não se escreve, não se fala, mas que se vê e se sente.
Duda conta que ele começa desenhando pequenos objetos e seres, desde animais a
personagens de desenhos preferidos. Depois as ideias vão sendo cobertas, de
modo que não sobra nenhum centímetro incolor na tela. Não há espaço cinza na
vida dele. A obra é sempre finalizada com uma “chuvinha”, como costuma dizer,
que é um respingar de tinta por cima, e o resultado é sempre uma enchente para
os olhos dos apreciadores.
Curiosamente, o
trabalho final é sempre uma pintura abstrata, muito embora os autistas tenham mais
facilidade com o mundo concreto. “Acredito que é a maneira dele expressar os
seus sentimentos e de como ele enxerga as coisas e o mundo. É a percepção dele.
Eu também fiquei bastante surpresa pelo Mateus pintar abstrato, mas observando
os desenhos dele, percebo que ele realmente não consegue fazer um desenho com
detalhes como as crianças da idade dele. Ele faz rabiscos, que pra ele são
objetos e personagens”, explica Maria Eduarda. Essa é uma experiência palpável
de amor também. Duda decidiu se empenhar na vida do filho e incentivar as artes
plásticas como forma de inseri-lo no mundo. Hoje, os quadros são
comercializados, Mateus participa de exposições e até de oficinas com outras
crianças, autistas ou não. Um perfil foi criado no Instagram chamado EleArtista,
um trocadilho semântico entre artista e autista, para divulgar o trabalho e
chamar a atenção para as múltiplas possibilidades das pessoas com TEA.
“A arte nos deu
esperança. Nós tínhamos uma criança que não falava, que não interagia, que não
olhava no olho por muito tempo, que não era capaz de expressar seus
sentimentos. Hoje ele é muito mais capaz de fazer tudo isso com muito mais
autonomia, e tenho certeza que a arte ajudou muito. A arte trouxe nosso filho
para essa vida. Hoje vemos ele sorrindo e cada vez mais feliz com suas
descobertas. Ele diz que quando crescer vai ser pintor e pintar muitos quadros
bem grandes. Isso nos deixa muito felizes, por saber que ele tem perspectiva de
uma autonomia. Que ele tem uma perspectiva de crescer e fazer algo que ame
fazer. Esse é o desejo que qualquer pai e mãe têm em relação ao futuro do seu
filho. Ficamos felizes por ele ter descoberto algo que ele gosta de fazer, que
é natural para ele, que o deixa feliz, e que permite ele se regular e
transmutar as suas dificuldades”, encerra mãe.
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